“Os livro”: que tal isto ser aceito como português correto?

by Maria Beatriz Lobo - maio 18th, 2011.
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Pensei em iniciar meu Blog com algum tema ligado à minha experiência de vida, mas fui atropelada pela notícia de que o MEC manteve como livro de referência aquele mostrado no Fantástico que enfatiza que muitas pessoas cometem erros de concordância, mas que é correto falar “os livro”, desde que a pessoa tenha cuidado para não sofrer “discriminação linguística”.
Já tomei conhecimento pelos jornais de várias opiniões (a maioria contra e algumas a favor) e queria apenas contribuir para o debate dizendo que, como sempre no Brasil, com o objetivo de ser “politicamente corretas”, muitas pessoas trabalham com uma visão no mínimo curiosa do que chamam ”inclusão”. Ao pensar em defender quem fala errado afirma-se que o desejo é de inclusão, mas convenhamos que incluir no rol dos discriminadores quem critica a fala que fere a norma culta, isto é demais!
Uma coisa é exemplificar e demostrar que, desde o começo dos tempos, as sociedades encontram formas específicas de comunicação, muitas vezes distintas daquela que se considera a língua formal. Tratar este assunto não serve só para “incluir” os adultos que são semialfabetizados na sociedade intelectualizada.
Defendo que podem e devem ser usados vários exemplos de linguagens correntes (não só faladas) que caracterizam uma população, uma “tribo”, ou um conjunto de pessoas que adota códigos e simbolismos próprios (até neologismos)  e mesmo variações da língua pátria, já que o assunto não se resume a erros de concordância.
O que acho um verdadeiro escândalo – que é um demonstrativo fiel dos rumos que vem tomando a educação brasileira há muito tempo, mas que está se recrudescendo ideologicamente desde 2002 - é a defesa apresentada na obra citada de que falar assim “está correto” e pior, achar que em nome da “inclusão” se deve ensinar desta forma isto nas escolas.
O papel da escola é reconhecer o mundo real, sem deixar de identificar e transmitir a verdade, o que a sociedade em geral adota como padrão ou norma, ou como conhecimento adquirido e reconhecido como correto e isto serve para as línguas, as ciências, as leis, para tudo enfim. Esta concepção de que cada um tem seu próprio conceito das coisas e que todos os argumentos são válidos pois o importante é o discurso e não a busca da verdade é, na minha opinião, um retrocesso que não tem ajudado nada ao nosso país e à educação de nossos jovens.
Deve-se ilustrar as formas que são usadas na comunicação falada, mas não deveria ser permitido a nenhum professor considerar e ensinar como certo aquilo que foi definido e aceito como errado.
Exemplificando: vejam a forma como as pessoas se comunicam pela internet. Uma aula pode mostrar para exemplificar como estes “signos” agridem a linguagem culta, mesmo que todos saibam que serão aceitos em situações semelhantes, mas é obrigação da escola explicar e ensinar que a forma como se escreve na internet (com as abreviações e outros termos que remetem ao registro de como se fala) não é aceita e não deve ser utilizável onde é exigida a norma culta, pois a norma culta é o que se considera como o português correto.
Conhecer, aceitar que existe, entender onde se aplica (como também ocorre no caso da gíria) é muito diferente de afirmar como correto no contexto educacional, que não tem como único objetivo incluir os cidadãos que possuem deficiências de formação, mas principalmente a missão de transmitir valores, normas, conhecimentos e atitudes que são considerados corretos, verdades estudadas e admitidas como válidas nos preceitos definidos por um conjunto maior do que um grupo, uma escola, ou uma parte da população.
Que existe gente que fala assim, muita gente mesmo, existe é claro, mas a escola tem que explicar que escrever “os livros..” está errado e que as outras formas podem ser aceitas em determinadas situações, mesmo estando erradas! Ser aceito não significa que é certo. Este precisa ser o compromisso de um país, de uma sociedade, de uma escola e de um educador, caso contrário, vale tudo!
 

2 Respostas para “Os livro”: que tal isto ser aceito como português correto?

  1. Realmente acredito que o mal do livro "Por uma vida melhor" seja estar na verdade defendendo uma vida pior. Com a suposta intenção de fortalecer a democracia, só faz enfraquece-la, já que infla a desigualdade tirando dos menos privilegiados as oportunidades que todos devem ter, e a aptidão de discordar de regras, se for o caso, com sólido conhecimento de causa. Então enquanto as chamadas "elites" mandam seus filhos para escolas particulares que ensinam as crianças a falar e escrever um português correto, os alunos das escolas públicas são condenados a passar a vida sem saber usar a lingua corretamente. Dizer "nós pesca" não é coloquial, é simplesmente incorreto, e não é como os que têm liberdade de escolha profissional, e seus filhos, falam. Encorajar crianças a falar assim é tirar delas a possibilidade de seguir estudando. Afirmar que é preciso aceitar esses deslizes porque afinal de contas devemos ser "democráticos" e essas crianças só sabem falar assim, é julgá-las incapazes de absorver ensinamentos e evidencia um terrível, apesar de muitas vezes bem intencionado, paternalismo classista. Além disso essa turma "democrática" parece desconhecer o fato de que via de regra as criaturas, principalmente as jovens, desejam fazer trabalhar sua inteligência, aprender coisas novas, e sentem prazer em progredir. O que é preciso é dar-lhes professores respeitados e bem remunerados que, entusiastas competentes, façam as crianças entender que não é "feio" falar como falam, mas que existe uma forma bem mais apropriada e eficiente de usar a língua. E através das crianças estarão, em muitos casos, instruindo também os pais.

  2. Maria Beatriz Lobo

    Você foi além e denunciou exatamente a coloração política que as pessoas querem dar para justificar estas posturas. A inclusão – como se pudesse existir de fato inclusão sem educação – é a desculpa para tudo. Palavras como democracia, republicano e cidadão tomaram no Brasil rumos esquisitos e muitas vezes totalmente despropositados.
    Concordo plenamente contigo.
    BJ

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